O céu estava cinzento e a chuva
continuava obstinada. As malas estavam feitas e a casa estéril. Tudo se movia
com pés de chumbo, até os ponteiros dos segundos. A minha pressa era maior que
a minha impaciência e, a minha impaciência menor que a inércia. Não sabia de
deveria ir. Fiquei submersa nestes pensamentos pretorianos algumas horas. A
ideia de partir perseguia-me de maneira intermitente.
Tomei uma decisão, a de ir sem
pensar no amanhã de um ficar. Afinal nada me prendia neste país bolorento, tudo
me aborrecia e entediava mas, o conforto da certeza era um sentimento
almofadado que me aconchegava as incertezas. Vou. Escrevi um bilhete a
despedir-me: “Querida casa vou partir! O facto de te conhecer tão bem deixa-me
certa, e certezas com a minha idade não é o que quero ter no bolso. Adorei os
momentos que partilhamos, vou guardar comigo todos os segredos confidenciados,
desesperos e felicidades vividas. Desculpa a exiguidade literária mas estou com
pressa. Um abraço do teu tamanho!”
Peguei nas malas, passaporte e
vontade de viver e bati a porta.
O trajecto para o aeroporto foi
longo mas suave, sentia que ia ficando mais leve a cada km que percorria. O
encontro estava marcado para as 10h. O tempo era escasso, e a minha sofreguidão
pelo cumprimento escrupuloso do compromisso era colossal. Cheguei 1 minuto
depois da hora marcada. Fui presenteada com o peso ausência, a grande amante da
solidão. Quando cheguei o chão ainda exalava sorrisos sarcásticos da minha
pressa. Ele partiu e não cumpriu. De que vale a pressa? Desprezei o tempo, não lhe dei a atenção de
que era merecedor e ele não esperou por mim, nem um minuto. Gostava de poder
mover o meridiano e ganhar mais uma hora, se bem que me bastava um minuto. Um
minuto foi o tempo que eu precisei para mudar a minha vida. Peguei nesse
minuto, embrulhei-o, dobrei-o em 12h, sem o vincar muito e embarquei. Um minuto.
A fracção de tempo que eu precisei de perder para perceber todo o ecossistema
esotérico e físico que me circundava. Não estou sozinha. Num bambúrrio entrego-me
assim ao mundo apenas num minuto, espero uma eternidade inexaurível de horas de
felicidade e anos infinitos de aprendizagem. Embarco a valorizar todos os
minutos frémitos disfarçados dos relógios inclementes.
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