E
se ninguém conseguisse mentir? E se todos nós fossemos obrigados à
transparência da verdade? O que seria das nossas vidas e das nossas
consciências? Até que ponto uma consciência tranquila é uma consciência
verdadeira? Será que podemos ser assim tão maniqueístas?
Eu,
penso que não. Não podemos viver sempre em duas cores tão fechadas que se
encerram sobre si próprias. Não sou apologista da mentira eterna mas, também
não sou apóstola de uma verdade prostradora. A verdade talvez seja perfeita
para ciências exactas, mas não para a vida. Como se pode aplicar um conceito
tão matemático e recto a uma vida tão literária com tantas curvas? Uma vida
recheada de beleza, esperança e fé não se pode coadunar com a nudez de uma
verdade certa, sem vírgulas, sem casas decimais. A verdade é um véu com cores
infinitas, sombras intermináveis e reflexos isotéricos. A verdade deslinda-se e
caminha sozinha, sonha e multiplica-se. A ambiguidade do núcleo da verdade vai
do mar ao céu.
O
celeuma desta questão é que o mundo inteiro sabe e acredita que um mais um são
dois ou que dez menos cinco são cinco. Mas quando se fala em verdades que não
têm forma e que não são palpáveis a verdade já não é assim tão verosímil.
Quando se fala nos feitos de Aristides de Sousa Mendes, Nelson Mandela ou de
Dalai Lama, há sempre alguém que diga que aquilo pelo qual pugnaram “não era
bem verdade”. Esta obstinação pela certeza redonda e compacta desassossega-me.
Toda a gente corre atrás da verdade, mas quando se desembrulha tropeçam nas
buracos das dúvidas, inclinam-se de forma virtiginosa no abismo da incerteza e,
ou dão um passo de fé ou um tiro no pé. Mas que verdade é essa tão tirana e
ubiquista que trilha o seu caminho pelas cordilheiras vilipendiosas dos espaços
da verdade? Onde começa uma meia verdade ou uma meia mentira?
A
verdade está na nossa inteligência emocional, nos ouvidos do nosso coração, é
acariciada pelos neurónios da sensibilidade. Mentiras? São verdades escondidas
com parte da cauda de fora!
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